Não tenho por hábito (aliás não gosto de o fazer) dar publicidade ao meu trabalho como voluntária social ou a minha participação em projectos de solidariedade social. Não vejo a solidariedade social como um alimento do ego, mas como uma obrigação ditada pelos meus valores.
Faço-o como forma de instar a reflexão e dar o meu voto de confiança a uma campanha em que acredito.
O texto que se segue é longo e eminentemente pessoal. Atrevo-me pensar que poderá ser um ponto de partida para uma reflexão sobre o que é fazer solidariedade social de forma mais consciente.
O próximo ano será muito difícil para muitas famílias, como aliás têm demonstrado os aumentos pedidos de ajuda que diversas instituições de apoio têm referenciado.
Antes de mais, informo que a minha posição é irredutível em alguns pontos e isso determina a forma como contribuo para a sociedade civil.
Mas há duas formas de contribuir. Uma é para descargo de consciência, damos ao pobrezinho 50 cêntimos para nos sentirmos melhor quando gastarmos 10 euros num DVD. Outra é de forma consciente, como contribuição para a sociedade civil… sem “inhos”.
Mas todos nos perguntamos num momento ou outro: quanto do que damos efectivamente chega a quem precisa?
Sei perfeitamente como funciona uma IPSS e uma ONG e os custos “da máquina”. Tenho plena consciência que para dar a alguém um saco de compras, foi preciso pagar salários durante todo o ano a quem organiza a recolha e distribuição, pagar armazenamento e transportes entre demais custos.
Eu sempre assumi isso como um custo meu para não ter de dar a minha contribuição directamente. Todos nós conhecemos famílias em situação de carência. E assumir esse custo é o preço que pagamos para colocarmos entre nós e essa família um intermediário. Outra questão é haver consciência que há um trabalho imenso que intermedeia a recolha e a entrega.
Eu tenho plena consciência (porque não sou ingénua e porque me esforço para me informar) que existem usos indevidos, seja por parte de instituições ou dos destinatários finais.
Eu assumo que apenas uma percentagem do que dou é útil para quem eu idealizo que seja. Sempre fui da opinião que se, do total da minha entrega, pelo menos 1 pessoa tiver uma refeição quando mais precisou dela, o que se perde pelo meio, apesar de indevido, foi justificado.
Por isso, quando partilho os meus rendimentos eu ajo de forma consciente, contribuindo apenas para instituições que conheço e confio:
– bombeiros voluntários locais – sou associada porque fazem um trabalho importantíssimo, especialmente no transporte de doentes idosos; para mim é uma contribuição obrigatória;
– associação de idosos local – porque mantêm activo um centro de dia para idosos, indo buscá-los a casa, nem que seja por umas horas;
– recolha de alimentos organizada pelos jovens escuteiros locais – é a instituição que conheço menos, mas que ainda assim faço questão de apoiar com 1 saco de alimentos, que geralmente recolhem na época natalícia; apesar de desconhecer o seu funcionamento, acredito nos benefícios de colocar jovens em contacto com o voluntariado, desde cedo;
– recolha de alimentos organizada pelo Banco Alimentar – é uma instituição que ajuda todo o ano e que me inspira bastante confiança até porque já conheci bastantes instituições locais que beneficiam da recolha alimentar; em regra, não costumo ir ao hipermercado ao fim de semana, preferindo comprar os vales que correspondem ao valor dos alimentos que quero doar, e que geralmente estão junto às caixas;
– recolha de alimentos organizada por IPSS locais – uma delas é uma instituição onde já trabalhei como voluntária e em que conheço muito bem;
– recolhas de donativos na rua em situações concretas: Abraço e Liga Portuguesa Contra o Cancro, Liga Portuguesa da Profilaxia Social, CERCI, APPCDM (sem prejuízo de me ter esquecido de alguma outra instituição);
– racho folclórico local – donativo pontual (regra geral no período das Janeiras) porque considero que é uma tradição que não se deveria perder. Poucos mas bons.
NUNCA dou:
– donativos por telefone
– vendas de material em portas de supermercados e shoppings
– recolhas de donativos porta à porta ou na rua, que são sempre para “criancinhas”
Isto porque, uma coisa é assumir os custos da máquina, outra completamente diferente é pactuar com esquemas de marketing social que pouco ou nada beneficiam as instituições que visam promover.
Por isso, há muito que comecei a aproveitar as promoções para fazer um cabaz de alimentos mais recheado. Porque tenho plena consciência que se me organizar, consigo mais e melhor por menos.